Título: O Príncipe da
Névoa
Autor: Carlos Ruiz
Zafón
Tradutor(a): Eliana
Aguiar
Editora: Suma de Letras
Gênero: Suspense/Ficção
Ano/Edição: (Brasil) 2013/1
1943. Max Carver e sua
família se mudam para um vilarejo (que mais parecia uma maquete, com casinhas
de cores claras e cercas brancas, todas no mesmo estilo, uma estação de trem
digna de colecionador, e um mar cristalino para fechar) por decisão de seu pai,
Maximilian Carver, relojoeiro metido a eletricista e inventor, que temia que a
guerra chegasse a eles se estivessem na cidade. Assim que chegam, a irmã mais
nova de Max, Irina, adota um gato que se aproxima da família enquanto esperam
pelo transporte na estação, gato esse que, a um primeiro olhar, Max acha
bastante suspeito. Ainda bastante afetado pela mudança, Max acaba ficando amigo
de Roland, adolescente local que o aborda quando estava observando o mar. Ele
descobre que Roland é o neto do faroleiro local, o único sobrevivente do
naufrágio do Orpheus, navio que havia
afundado ali há 25 anos quando bateu nas rochas altas da praia. Mas Max também
descobre que o naufrágio do Orpheus,
a história por trás da construção da casa para a qual haviam se mudado e o
misterioso cemitério de estátuas atrás da casa têm uma forte ligação, uma
ligação que pode ser mortal para ele, Roland e sua família.
Esse romance, o primeiro de
Zafón, foi publicado em 1993. Segundo ele, tinha 26 ou 27 anos na época que o
escreveu, o que lhe parecia muito mas que na verdade não era suficiente, e foi
publicado apenas porque teve a sorte de ganhar o concurso de literatura juvenil
no qual o inscreveu (pela falta de um editor). Na minha concepção é fácil
defini-lo como um conto: 180 páginas, uma estória rápida em que apenas um
grande clímax se apresenta. As tramas secundárias rapidamente se fundem numa
só, poucos personagens ganham grandes caracterizações – na verdade, quando você
termina de ler o livro, percebe que ainda não conhece Alicia (irmã mais velha
de Max que está tão presente na estória quanto ele) tão bem, e que os pais do
garoto, que quase não têm falas diretas no livro, são figuras distantes. Porém,
nada disso faz dele um livro ruim. É na verdade um daqueles que você devora
avidamente, principalmente pelo seu pequeno número de páginas.
Outra coisa que senti
quando li O Príncipe da Névoa, e isso
se deu por já ter lido romances zafonianos suficientes para não querer ler
nenhum outro autor, é que há alguns pontos em que você pode observar o quanto
Zafón tem razão ao dizer que era novo e prepotente quando escreveu este livro.
Enquanto em romances como A Sombra do
Vento e O Jogo do Anjo você tem
uma linguagem mais madura, mais articulada, n’O Príncipe da Névoa ele soa como se o próprio Max houvesse escrito
o livro – o que pode ter sido nada mais, nada menos que uma tática do autor. Há
também o uso de espaçamentos entre ideias, aqueles famosos asteriscos entre
parágrafos que nos levam para outra cena, outro momento. Nos seus livros
seguintes ele passa a usar descrições no lugar deles, seja de sentimentos ou de
locais, o que aumenta a intimidade na relação leitor-personagem. Outro ponto é
que nesse romance os personagens não são trabalhados tão a fundo, suas
histórias são rasas, enquanto em outros romances o escritor dá descrições
longas da vida de cada personagem que é ou se tornará essencial.
Mas essa avaliação se
resume a uma comparação entre os romances seguintes de Zafón e o discutido. Vamos
a uma avaliação mais geral (leia esta parte apenas se não se importar com
spoilers).
O Príncipe da Névoa é, nas palavras do autor, um romance que te
agrada aos 13, 14 anos, mas também aos 23, aos 43 e aos 83. É curto, tem uma
linguagem simples e acessível, e uma estória que cresce em torno de um mistério
que é revelado aos poucos, sendo que o melhor é guardado, claro, para o final,
o que nos leva ao clímax, onde os heróis enfrentam o vilão. Um roteiro
clássico. O que ele tem de especial? Bem, um dos pontos que acho bastante inteligentes
nele é que Zafón nunca cita o nome do vilarejo para onde a família Carver se
muda, nem mesmo o nome do país onde ele se encontra ou da cidade da qual
saíram. Apenas diz que é um vilarejo banhado pelo Atlântico, que o ano era 1943
e que a guerra estava presente, o que dá a você a noção de que deve ser algum
lugar na Europa (e, se levar em conta que todos os romances dele se passam em
Barcelona, você consegue dizer que talvez o país seja a Espanha). Ainda assim
você consegue visualizar todo o local e até conectá-lo a uma cidadezinha
litorânea que você visitou nas férias passadas. E você não percebe isso até o
momento em que o nome do lugar lhe faz falta (eu mesma só percebi quando pensei
em escrever uma resenha sobre o livro). Outro é que, apesar de não conhecer os
personagens tão bem, você ganha carinho por eles. Marximilian Carver, por
exemplo, é um personagem cuja personalidade é sucintamente representada e pelo
qual você percebe que tem afeto.
As falhas são claras
também. A questão de não trabalhar bem os personagens é uma delas: coisas ficam
faltando. Irina se torna um personagem distante, cujo acidente você mal sente.
O próprio Príncipe da Névoa, apesar de descrito, não tem sua história contada
por completo, o que te deixa um tanto em cima do muro, sem saber se o odeia ou
o venera. Por ser um romance curto, Zafón economiza em descrições e detalhes.
Isso te deixa um tanto perdido às vezes e causa perguntas que provavelmente
nunca vão ter respostas. Uma delas é o porquê de os relógios sempre andarem
para trás quando o Príncipe da Névoa se mostra presente. É porque sua presença efêmera
os afeta ou porque ele já viveu tantas vidas que o tempo talvez nem lhe faça
diferença? E mesmo assim, porque andar ao contrário? Quando o Orpheus retorna do fundo do mar, trazido
de volta por Cain, a antiga rachadura em seu casco não parecia fazer diferença
para ele, a água não conseguia entrar de volta por ali. Porém, quando o navio
se choca novamente nas rochas e abre uma segunda brecha em seu casco, ele volta
a naufragar. Cain ainda está ali e deixa que isso aconteça ao navio sem
pestanejar, mesmo sendo o tão poderoso Príncipe das Névoas e tendo sido tão
apegado ao navio por anos. Por quê? Porque sabia que por mais que Roland e
Alicia tentassem, o primeiro não conseguiria se salvar? Ou porque simplesmente
achou que repetir o naufrágio do Orpheus,
exatamente 25 anos depois, seria “uma boa ideia”? São perguntas para as quais
você supõe respostas de acordo com o que lê, respostas que parecem óbvias até, porém
nada fica 100% explicado.
Em resumo, é um livro bom
para se passar o tempo – um voo ou uma viagem de carro, por exemplo. A estória
é boa e te prende até o último segundo. Como fã do autor, eu adorei o romance e
espero que outras pessoas possam lê-lo e adorá-lo também.
Sou Liss, blogueira do
Poser Side e parceira do Lunáticos.