É incrível como o
desespero desperta coisas novas no ser humano.
Anthony Burgess, professor do
Serviço Colonial Britânico na Malásia, Dramaturgo, Escritor, Poeta, Línguista,
Tradutor e Crítico, descobriu que tinha um tumor no cérebro e, como diziam os
médicos, pouco tempo de vida (o que não foi verdade, ele viveu até os 76 anos
de idade com a doença, falecendo em 1993). No meio de todos os problemas, Burgess
escreveu vários livros na tentativa de garantir um sustento para sua esposa
após a sua morte. Em um belo dia, ele teve a ideia que geraria a sua obra prima
literária. Imaginando um futuro caótico, autoritário e violento, o escritor
desenvolveu a história da vida de Alex. E no meio de ideias confusas,
juntamente com a criação de um novo dialeto, seu brilhantismo deu origem ao livro
Laranja Mecânica, eleito um dos 100 melhores livros em língua inglesa pela
revista Time.
Ambientado em um
futuro impreciso (mas não distante), Laranja Mecânica é a perturbadora confissão
autobiográfica de Alex, líder de uma gangue adolescente que se reúne para
cometer perversidades e atos de violência pelas ruas de uma Londres decadente.
Após uma incursão malsucedida, Ales é capturado pela polícia. Na prisão, é
submetido a uma experiência de reengenharia social desenvolvida para eliminar
tendências criminosas, cuja finalidade é reeduca-lo psicológica e socialmente. Uma
experiência extremamente dolorosa e tão desumana quanto a ultraviolência que o
próprio Alex costumava praticar.
Burgess tem um
jeito único de escrever. Sua história e seu jeito de construir personagens e
suas respectivas ações não podem ser comparados a nenhum outro escritor. Alex
narra todo o livro como se estivesse falando somente com você e com uma classe
fora do comum. O leitor esquece por um momento que existe um Burgess por trás
de tudo aquilo e crê, diante do mundo em que vivemos que tudo que acontece com
Alex é perfeitamente plausível. E é aí que vemos a genialidade de Burgess. Tudo
foi feito e pensado na década de 60 (o livro foi lançado em 1962), visando um
futuro não tão distante. Por esse motivo o livro sempre foi e sempre será
atual. Quem garante que o nosso futuro não pode ser o mesmo daquela Londres
caótica de Alex? Será que os jovens do futuro não falarão gírias e cometerão
atos semelhantes aos dele? Essas dúvidas levam o leitor a magistral reflexão
proposta por Burgess, mesmo após mais de 50 anos do seu lançamento.
Em 1971 a história
de Alex chegava aos cinemas pelas mãos de Stanley Kubrick. O filme é um dos
maiores clássicos da história do cinema (clique aqui e saiba mais). Só que
Kubrick não usou o final do livro de Burgess na sua adaptação, dando uma conclusão
mais intensa na vida de Alex. O autor não gostou dessa alteração. No final do
livro, Burgess tenta aliviar a violência da historia " humanizando"
um pouco as atitudes Alex. Só que, para a narrativa do filme de Kubrick, esse
final não funcionaria. Ele então finalizou o filme de uma forma mais impactante,
cortando esse “final feliz”. E com certeza foi a melhor atitude. Depois de
descrever tanta violência durante toda história, não há espaço para remorsos.
Mesmo assim, com todos os espectadores aprovando a versão de Kubrick pela fidelidade
a história original, Burgess ficou insatisfeito com essa alteração pelo resto
de toda sua vida, criticando o diretor em entrevistas.
Laranja Mecânica
já foi adaptado, além do cinema, em uma peça teatral e um musical. Mas a experiência
de conhecer a historia de Alex pelo livro é única. De tão boa, não se espante
se você estiver entendendo e falando perfeitamente as gírias de Alex e seus
comparsas (ou Drugs, como assim são chamados). Conheça, se apaixone e perca a
cabeça com toda a perfeição em cada página de deste livro incrível.